Monday, June 25, 2012

Coisas de mineiro


O mineiro adora falar "vai com Deus!" e "fica com Deus!", mas na hora de falar mal, quase sempre fala pelas costas.

O mineiro se acha o mais educado do mundo! Mas você tem que falar com ele no mesmo tom, se falar noutro tom - se vier de outro lugar, por exemplo, onde se usa outros tons - o mineiro não consegue entender.

Em Minas o mais provável é que olhem primeiro para os seus pés: para ver o que você está calçando. Toda a boa educação do mineiro para com a sua pessoa vai depender disso (e claro, da calça, blusa, bolsa, relógio, colar, pulseira, carro, etc. que você estiver usando).

O mineiro se acha muito inteligente, mas não sabe falar sobre religião, nem sobre política, nem sobre futebol. Assim, é e será sempre escravo.

O mineiro não gosta de sair de casa para conhecer o mundo. Viaja rapidinho pra praia e já volta cheio de saudade. Poucos deixam de morar no seu estado natal. O amazonense também é assim, mas ele está no Amazonas.

O mineiro é um povo trabalhador. Ao invés de aproveitar a vida, trabalha. Ao invés de fazer festa, trabalha. Ao invés de sentir prazer, trabalha. Vida, festa e prazer são pecado, o trabalho enobrece o homem - só não sabe o mineiro que tudo isso foram padres que inventaram para escravizá-lo.

O mineiro defende o padre, não com unhas e dentes, mas com seu silêncio.

Tuesday, June 19, 2012

A história do nosso fracasso


"Querem saber a história abreviada de quase toda a nossa miséria? Ei-la: havia um homem natural. No âmago desse homem, entretanto, foi introduzido um homem artificial, e ele desencadeou no interior da caverna [leia-se Europa] uma guerra civil que se prolonga por toda a vida." - Diderot (1773)

Os chineses antigos sabiam que os mais antigos, mais naturais, eram pessoas melhores, menos frágeis e medrosas do que nós, os "modernos". Daí se referem ao passado como shang (上 acima) e ao futuro como xia (下 abaixo), que é o contrário das imagens ocidentais, que normalmente colocam o passado abaixo e o futuro acima em gráficos, linhas do tempo, cladogramas, etc. Os chineses também não caíram na ilusão do progresso como nós, ocidentais. Estão participando do nosso jogo econômico para nos vencer com nossas próprias regras. Mas além disso ainda guardam memória de uma cultura que reconhecia no passado um homem mais nobre, e não o aguardam em nenhuma promessa de alguém que ainda virá (como é o ocidente, seja o cristão, aguardando a segunda vinda de Cristo, seja o ateu, aguardando o futuro onde a ciência terá "emendado" o mundo - como se isso fosse possível - coisa que os chineses já sabem desde antes do Dao De Jing).

"Hoje em dia, quando a educação mais elaborada e o gosto mais cultivado [sic] reduziram a um conjunto de regras a arte de agradar aos demais, nossa conduta é governada por uma servilidade baixa e enganosa, de modo que todo preceito de polidez exige constante obediência. As boas maneiras nos são ditadas, e devemos sempre seguir seus comandos, nunca nossa própria natureza. Sob essa incessante restrição, já não ousamos parecer como de fato somos. Naquele rebanho de ovelhas a que chamamos sociedade, cada homem em situação semelhante faz exatamente as mesmas coisas que os outros. [...] Assim, não há mais nenhuma amizade sincera, nenhuma estima, nenhuma confiança segura. A suspeita, o ressentimento, o medo, a frieza, a reserva, o ódio e a traição estão sempre à espreita, ocultos por um véu de permanente e traiçoeira civilidade. Os sentimentos estão sufocados pela tão admirada urbanidade que devemos ao esclarecimento deste século." - Rousseau (1750)

Isso naquele século. Na cabeça dos ocidentais, conforme suas aulas de história o ensinaram, hoje estamos melhor, hoje temos liberdade, democracia, liberdade de expressão. Mas, contraditoriamente, quantos usam essas liberdades? Quantos a usam para discutir, para questionar, para nos fazer pensar? Seja em sala de aula, em casa, no ambiente de trabalho, no bar, os poucos que o fazem costumam ser recebidos com silenciosa apreensão. O ser humano nunca foi tão alienado como é hoje nos grandes centros urbanos. A alienação dos estadunidenses sobre o mundo e o ser humano é notória - e eles são a "obra-prima" do capitalismo global. Hoje seguimos seu modelo ao tentar imitar personagens de filmes, novelas e comerciais - sem falar nos noticiários - e muitos não bebem com medo de expôr sua verdadeira natureza - o que arruinaria uma auto-imagem racionalmente construída com base nos modelos de "sucesso" disponíveis. Que lamentável! E a maioria parece não ter ainda percebido a farsa.

"Demonstramos profunda incompreensão do animal de rapina e do homem de rapina [...] incompreensão da 'natureza', ao procurar por algo 'doentio' no âmago desses mais saudáveis monstros e criaturas tropicais, ou mesmo por um 'inferno' que lhes seria congênito --: como sempre fez quase todo moralista. Não parece haver, entre os moralistas, um ódio à floresta virgem e aos trópicos? E uma necessidade de desacreditar a todo custo o 'homem tropical', seja como doença e degeneração do homem, seja como inferno e automartírio próprio? Mas por quê? Em favor das 'zonas temperadas'? Em favor dos homens temperados? Dos homens 'morais'? Dos medíocres? -- Isto para o capítulo 'Moral como pusilanimidade'." - Nietzsche (1886)

O sonho do progresso não passa de um pesadelo. Enquanto alguns moram em apartamentos menos empoeirados, suas crianças não sabem o valor da terra. Enquanto alguns usam aparelhos elétricos para quase tudo, seus vizinhos não mais se reúnem à vontade para celebrar. Enquanto alguns vivem até os 90 anos, a maioria se escraviza para permitir fortunas alheias - como se antes não se vivesse até os 90. Como se a longevidade fosse uma descoberta recente da medicina.

Quanto mais nos afastamos da Natureza, menos sentido têm nossas vidas. Quanto mais valorizamos a aparência jovem e desprezamos a sabedoria dos velhos, mais medíocres nos tornamos. Quanto mais "sucesso" e "reconhecimento" queremos num mundo que só valoriza pedrinhas douradas (como certos pássaros não muito mais inteligentes que nós), mais destruímos o que realmente importa. Silenciosamente e em paz.