Saturday, May 20, 2006

A história de uma poesia

(ou O DEVER E O QUERER)

Hoje eu fui a uma festa, onde tinha muita gente.

De tanto olhar e falar, eu decidi uma hora pensar.

Que tinha gente
e coisas que eu podia fazer,
e coisas que eu podia falar,
e coisas que eu devia fazer, ou falar.

Eu saí da festa com uma impressão esquisita.

Eu só falei o que eu quis.
Eu só fiz o que eu quis.
Eu não entendo quem se esconde e se pergunta
se devia ter feito o que nem tinha ainda
chegado a falar.

Eu só fiz o que pude,
e só me lembro do que aconteceu.

Se precisa coragem ou tamanho?
(Quem entenderá do que estou falando?)
Se precisa tanino ou canino?
se se perdoa o cochilo
de um navegante?

Se for capaz de dormir
o justo quando o injusto
leva adiante a espécie?

Então é capaz de perdoar
o chefe que reconhece
no estranho seu semelhante.

É capaz de esquecer quem
de peito leve perdoa
o seu amante.

É capaz de esquecer quem
cedo acredita
e demasiado tarde percebe
que não tem escolha.

É capaz de fritar um ovo
no gelo seco
ou pescar uma ameixa
na tempestade.

Se precisa de coragem ou tamanho?
É preciso sutileza ou honestidade?
É preciso a verdade ou o vai levando...?

Aonde foi parar o movimento?
Onde estará a chaga mortal da humanidade...

... que é seu próprio suspiro,
sua própria esperança,
sua própria ingratidão,

com tudo que lhe foi dado
assim de bandeja...
é vendido ao estradeiro
ao garimpeiro, ao hortifrutigranjeiro,
ao soja-gado-empreiteiro,
ao desassossego que todos conhecem
ou na cidade ou no campo
ou na família velha ou no casamento,
do cidadão querendo viver bem
e outros oferecendo bem mais que é preciso.

Quem acordará e se lembrará
das nuvens que passaram rosadas,
da alvorada retumbante
de pássaros que vêm distantes
de lugares assaz confiantes
de gente que era ainda gente.

Quem ligará a TV e ouvirá
a concórdia que foi um dia
a guerra antes de ser fria
e a paixão quando era permitida.

A ilusão quando era sentida,
sem ser esquecida
debaixo da cama vazia,
num madrugar de alegria,
esquecida, esquecida,
sentida.

A noite sem verbo,
sem prosa
sem rima,
sem esperança,
sem vida,
você pensará -
sem vitória
sem alegria,
sem lamento
sem fantasia
o sorrir do lagarto
outro dia
sem lamúria
ou rebeldia
apenas verdade gritante
a asa do tempo andante
o couro do velho adiante
e tudo mais que se encante
e faça dessa mistura
e dessa coisa flagrante
um algo de que não se esqueça

e pra sempre se lembre
que um dia existiu
e foi real e fora de cogitação
foi beleza
foi delícia
foi comum
foi a vida
existência
que ainda tardia
não deixa nada a desejar

a desejar...

a desejar estão outros
que não entederam
esta não-poesia.

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