Sunday, August 03, 2008

Rio de Janeiro

O Rio de Janeiro continua lindo, a Zona Sul com sua elite de sempre, os negros ainda porteiros e babás, os vidros dos carros fechados, os nomes das lojas em inglês, francês ou espanhol. Jovens na porta da boate da zona sul se referem às pessoas que moram na Zona Norte como "lixo". Os gays continuam dizendo que procuram gente com conteúdo, mas não colocam conteúdo pra dentro, só aminoácidos. Na boate em que se paga na entrada e antes de beber, é proibido sair pela porta de emergência, embaixo - não há motivo ou justificativa, é apenas a regra da casa. Três policiais entram no ônibus armados, revistam algumas pessoas, me perguntam em primeiro lugar onde moro - sou mais suspeito se moro em certos lugares -- tive medo que me assaltassem. Depois perguntaram de onde vinha e para onde ia. Manaus, Jacarepaguá, Glória. Não me revistaram. O estudante de administração não espera nada no futuro, diz que vamos "destruir tudo mesmo". Só devemos aproveitar a vida, pois. Não concordo, sou menos egoísta. Negros pedem esmola, mas sem muita boçalidade: não querem manchar a imagem do Rio Turístico. Dou-lhe um gole de cerveja, as bactérias não distinguem classe social. Mas outros não dariam, independente de beijarem cinco numa noite. As pessoas aqui em geral são educadas, cultura só prejudicada pelo hábito de contarem vantagem e se acharem esxpertos quando estão em outros estados. O Sol continua nascendo do outro lado da praia, e mesmo no inverno Copacabana está lotada às oito da manhã de sábado. Jacarepaguá é longe pra burro, e muita gente tem medo de ir até lá porque o ônibus passa pela Cidade de Deus - eles viram o filme. É lá que moram as "pessoas-lixo", segundo o dialeto da zona sul. Pensando bem, todo o mundo, tirando a zona sul e talvez alguns bairros de São Paulo, Miami, Nova Iorque e Paris, "são lixo". E todo o resto, cujas fantasias nascem na tela da Globo, invejam esses idiotas. Mas a senhora no acarajé, que de início parecia antipática, se despede da vendedora pelo nome, com tchau e um sonoro obrigada. Nas ruas, como em Manaus, muitas vezes somos "querido" ou "meu querido" (mas Manaus vai além, e somos até "meu amor", para homens ou mulheres). Como em Manaus, muitas vezes a pessoa repete a informação pedida mais que o necessário. Ao contrário de Manaus, domingo o ônibus custa o mesmo, e não metade. Mesmo no inverno, cai às vezes uma chuvinha boa. O clima não é tão frio nem tão seco que me rache os lábios, como em BH. Mas nas festas da zona sul os brancos parecem ser a única raça presente no país, tirando o segurança - via de regra negro. Os clientes homens em geral parecem tomar mais hormônios do que aulas, e as mulheres bonitas não se incomodam se trombam nos desconhecidos enquanto dançam drogadas. Ao menos nos deixam entrar de chinelo, para revolta dos que gastaram o salário na última roupa da moda. Em outra boate, um cara sai para tomar ar - provavelmente alguma mistura de drogas que quase não deu certo - e a amiga esclarece, sem ninguém perguntar, que "ele toma antibióticos". O segurança, novamente negro, ri. As músicas dos anos oitenta se repetem em diferentes boates e pubs, e várias são as mesmas que tocam em vários lugares de Manaus. Os anos oitenta produziram apenas 20 músicas memoráveis? E nas festas fora da zona sul, não sei, meus companheiros ricos ainda não tiveram vontade, ou coragem, de ir. Subornar a polícia num teste de bafômetro custa trinta reais, ouvi dizer. Um jovem já mui louco recebe a cocaína do amigo, mas já está tão pra lá que sopra ao invés de aspirar, vi acontecer. E só assim toleram a música que de resto não teria interesse. E estamos na zona sul da cidade "mais bonita do mundo". Poucos ouviram falar de meditar, ou que "o coração ocupado em se preencher não percebe a essência das coisas". Filosofia é coisa de nerd. Um funcionário que trabalha na Barra e mora depois de Guaratiba fica duas horas e meia no ônibus - duas vezes por dia, seis vezes por semana - e nunca leva um livro. Já poderia ter dois cursos superiores. Depois pensamos até num ônibus escola, onde professores substituiriam os vendedores de chicletes. Pensamos também numa sauna lésbica, coisa que ainda não existe, onde as mulheres poderiam relaxar, nadar, conversar e se distrair como num clube, com a vantagem de não ter a música alta das boates nem os olhares incompreendidos dos clubes e praias. Pensamos também numa boate sem música, onde as pessoas levariam seus iPods ou alugariam os da casa, e baixariam as músicas que não tivessem para ouvir ali mesmo. Para conversar bastava tirar o iPod, as luzes fariam o resto. Pensamos ainda muitas outras coisas, mas o mundo não está maduro o bastante para elas...

1 Comments:

At 1:19 PM , Blogger Prós said...

Muito bom. Não sei como o é o Rio de Janeiro, mas imaginava alguma coisa assim... meus parentes que moram lá, gostam. Mas sei lá...

Essa de soprar pó parece até piada...
Escolas ambulantes são uma boa idéia.
E pelo menos os caras deixam entrar nas boites de chinelo. Em BH não rolaria.

[]s!

 

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