A religião dos cientistas
II. 1 29 [57] 384-385
"Esta não deve ser a época da personalidade harmoniosa, mas aquela do 'trabalho coletivo'. O que significa somente isto: empregar-se-á pessoas na fábrica antes que elas tenham atingido o seu pleno desenvolvimento. Mas fiquem certos de que a ciência será logo arruinada, e também os homens submetidos a este trabalho industrial. A 'honesta mediocridade' se torna cada vez mais medíocre, o homem é mais sábio do que os outros num único ponto, mas é, em todos os demais, mais estúpido do que qualquer outro sábio do passado: in summa, infinitamente mais pretensioso. Sistema de carroceiros que decretam que o gênio é supérfluo: ver-se-á nas suas construções o fato de que eles só produzem como carroceiros, não como arquitetos. Para aquele que tem eternamente na boca os mandamentos: 'Divisão do trabalho!', 'Entrem no jogo!' etc., a este é preciso dizer alto e claramente: com querer a todo custo aguilhoar a ciência, vocês estão a ponto de arruiná-la, da mesma maneira que matarão uma galinha forçando-a por meios artificiais a chocar mais rapidamente. É verdade que a ciência progrediu, durante os últimos decênios, de maneira muito rápida: mas olhem então estes eruditos, estas galinhas estafadas. Não são mais naturezas 'harmoniosas'; cacarejam mais do que nunca, também os seus ovos são os menores que já se viu. Daí também a 'vulgarização' da história tão apreciada pelo 'grande público'. Isto é muito fácil para os eruditos, pois eles próprios pertencem, abstração feita de um pequeno campo, ao 'grande público' e compartilham de suas necessidades. É bastante para eles instalar-se confortavelmente, vestidos com o seu robe de chambre, e abrir a sua pequena especialidade a estas necessidades populares e não especializadas: este gesto cômodo será logo qualificado de 'modesta condescendência do erudito para com o povo', quando na verdade o erudito, na medida em que é mais canalha do que erudito, só é condescendente consigo mesmo. Criem primeiro um povo - não poderão jamais concebê-lo tão nobre e tão elevado!, mas o seu 'grande público', não poderia parecer mais vulgar!
- Nietzsche, Escritos Sobre História, Ed. PUC-Rio/Ed. Loyola. p. 294-295.
Dizem que falar mal da religião é chutar cachorro morto, mas a "raiva canina" ainda não foi eliminada. O maior mal da religião é fazer com que um século e meio tenha se passado desde essas palavras e até hoje a sociedade não as enxerga. A religião, sim, é a culpada, pois ensina o respeito à ordem, o não-questionar, o ter-de-acreditar. Daí nem os cientistas mesmos saberem questionar o sistema. "Deus é incognoscível", mas continuamos extraindo a moral dele, ou melhor, de seus parasitas. E mesmo quando nos dizemos "modernos", "espíritas", "católicos-não-praticantes", "espiritualistas-independentes-de-religião", "humanistas seculares", ainda seguimos a mesma moral religiosa que domina o ambiente cultural, pois acreditamos que "a religião dos outros deve ser respeitada". Os poucos que se levantam para dizer a verdade são silenciados, pois "certas coisas não se discute". Chega de mordomia! Para o inferno com a mentira. A religião é o maior de todos os males, e deve ser combatida dia e noite.
"Mas, coitados de nós, o que chuparemos enquanto a morre assustadora não vem? Quem vai nos contar histórias para dormir, agora que você nos quer fazer crescer? Não queríamos ter que crescer! É tão bom ter um confortozinho especial, e além do mais não estou fazendo mal a ninguém, a não ser àqueles que ataco e humilho mesmo sem querer, graças à minha moralidade retrógrada e mal informada, mas estudar é tão trabalhoso, você não pode chamar nossa ignorância de imoral só porque estudou."
Arrogante, eu? Apenas me pergunto: por que a maldita certeza, se dizem que Deus é incognoscível? Mistério, é só o que temos, mas na hora de atacar, de reprimir, de moldar a mente das crianças, assumimos o que a maioria assume, e com uma certeza que deixaria Jesus ruborizado.
A religião não é apenas inútil. Ela enfraquece o espírito crítico e anestesia a razão. O consolo que traz é o de desarmar um povo outrora autêntico e bravo. Um povo que já foi digno, e que hoje é um papagaio da razão (?) alheia, que não aprendeu a ler pois foi ensinado a "ler de tudo" - modernos! Pós-modernos! Quem diz "não acredite em tudo que lê" não aprendeu ainda a ler. "Confie desconfiando" talvez seja melhor. Enfim, não há fórmula simples para se ensinar a ler (muito menos a pensar!). E de qualquer maneira, depois que se aprende o funcionamento e o método da lógica, da ciência e da filosofia, há muitos livros que não devem mais ser lidos!
Na melhor das hipóteses, a religião é apenas um desvio de tempo e energia do que poderia ser a construção de um entendimento melhor entre as pessoas, famílias, classes sociais e povos. Mas nossa covardia e preguiça são maiores que nosso entendimento.
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