Wednesday, January 17, 2007

Coragem e sabedoria

O indivíduo corajoso o bastante morre na guerra sem se lamentar. Isso porque é tão corajoso que não há quase nada que ainda não tivesse experimentado. Quando um homem chega a esse ponto, de já ter provado de tudo um pouco, só restam duas alternativas: ou viver para sustentar, criar, educar e amar sua prole, ou viver por puro apego à vida - apego este que, do ponto de vista daquele que se entrega à guerra ou à qualquer forma honrosa de auto-destruição, é apenas um tipo infantil de egoísmo, pois apenas as crianças ainda não experimentaram o suficiente para permanecerem curiosas o bastante para viver. De qualquer forma, sacrificar-se na guerra é outra - e, espera-se, a última - forma de garantir o sustento, a formação e o respeito dos próprios filhos, dada a necessidade.

Outra coisa são os sábios. Estes não se sacrificam, nunca se sacrificaram, porque sua existência já é uma renúncia em favor do conhecimento, por amor ao conhecimento, e este se faz, geral e preferencialmente, às expensas da prole. Renúncia a quê? você pergunta. À normalidade. À vida social, prazerosamente simples, animada pelos amores e tragédias comuns a todos, e que permitem a todos se identificarem a uma espécie comum - comum - da qual o sábio ora lamenta, ora agradece não fazer parte.

De um lado, o guerreiro; de outro, o sábio.
De um lado, carne. Do outro, a mente.
Esta dicotomia move o mundo e alimenta os espíritos. Ou não, o mundo se moveria só de carne, mas não foram as armas, a pólvora, flechas, armas, tecnologia e indústria os substitutos dos músculos na eterna luta pela sobrevivência? Não seríamos humanos sem a mente. E o ser humano, entre os animais, distingue-se pelo exagero, pela desproporção de todos os seus atributos destinados à inteligência. Dado este quadro, não seria de se esperar uma casta imune à atração quase gravitacional do imperativo reprodutivo? Imune, em outras palavras, dos prazeres exclusivamente carnais? E libertando-se, assim, mais que os outros para os prazeres da criação intelectual?

Não poderia, em tal quadro, a seleção de grupo desempenhar uma tarefa significativa?

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